sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Vestido, fumaça e palavrão

Abri o meu armário procurando um pijama e encontrei três pessoas. Tinha espaço suficiente para as três, mas uma delas, de pernas abertas e falando bem alto, ocupava boa parte do lugar dos demais. Era o João. Usando um casaco verde musgo com uma bermuda bege bem larga, ele aproveitava o conforto da vestimenta para se sentar bem à vontade enquanto contava para os outros uma história meio sem pé nem cabeça permeada por muitos palavrões.

Sentada em um cantinho, como quem não pertencesse àquele lugar, a Doralice enrolava seus cabelos com os dedos e ajeitava seu vestido florido para que os pés sujos do João não o sujassem. Ela estava tão quietinha no seu canto que tive vontade de colocá-la em um chaveiro e enchê-la de babados. O único barulho que emitia era uma tosse seca. E foi aí que eu reparei na fumaça.

Era da Carmen que, de pernas cruzadas e lábios cor de carmim, fumava um cigarro bem fedido com piteira. Eu tratei de arrancá-lo de sua mão antes que defumasse todas as minhas roupas. Ela nem se abalou e, lançando-me um olhar de desprezo, virou para o lado e começou a mexer em seu colar de pérolas. É uma pessoinha nojenta, mas impõe uma autoridade no João que eu nunca tinha visto. O menino é hiperativo, mas tomava um cuidado danado para não esbarrar em sua roupa feita sob medida. a Carmen tem todo um jeito misterioso que me intriga, mas não posso dizer que gosto dela. Assim que encontrei meu pijama, ela tirou outro cigarro do bolso e fez uma cara de “você não manda em mim”. Irritada, fechei o armário e fui dormir.

Nenhum comentário: